segunda-feira, 16 de junho de 2014

DESAMOR

Foto: Cairo Brunno (07.06.2014)
                Aonde você vai a essa hora? Não gostou da comida? Não gostou do perfume novo que eu comprei? Está fazendo as malas porquê? Você vai embora? O que eu te fiz? Eu fui a mulher mais honesta dessa cidade inteira. Lavei tuas roupas, te preparei jantar, segurei tua barra penhorando meus brincos de ouro quando te faltou emprego. Não houve briga nem desassossego. Porquê? É outra não é? Qual o nome dela? Qual o nome dessa desgraçada que está te tirando de mim?
                Vem aqui, vem. Lembra que eu te amo? Lembra que você e eu juramos ser um do outro enquanto caminhássemos sobre a terra, por pior que fosse? Quantos vendavais já enfrentamos, me diz? Quantas vezes já passamos por momentos mais dolorosos? Quantas vezes já passamos fome, frio, já ficamos descalços e nus mas mesmo assim permanecemos um ao lado do outro? Tem dedo de mulher nessa história sim, eu tenho certeza. Eu tenho faro para descobrir essas coisas.
                  E se eu descubro? E se eu encontro você com outra por aí? O que eu faço? Olha pra mim, Chico! Eu não sei ler, não sei escrever, não tenho estudo nem tenho dinheiro. O que é que eu vou fazer sem você? É difícil enxergar que você é a minha vida? Será que você não enxerga? Você é homem, é forte, é bruto como um touro. Pode trabalhar, pode carregar madeira, abrir estrada, mas e eu? Vou fazer o quê? Mesmo que eu trabalhe em casa de família, lave e passe, vai faltar o principal, que é você.
                Não vai! Fica aqui, homem! Não sai por essa noite fria procurando amor, que você já tem aqui dentro. Não sai procurando outra cama se a tua já está tão quente. Não vai se satisfazer em outro corpo, não. Pensa bem. Se ela te aceita desse jeito, quem garante que não vai aceitar outro que também seja casado, que também tenha família? Olha bem pra mim. Eu imploro, ajoelhada diante de ti porque você se tornou o meu deus. Não vai. Fica mais um pouco. Fica mais uns dias, pensa, pesa os fatos. Por favor!
             Pois muito bem. Se você quer ir, a porta está aberta. Eu tentei te prender comigo aqui deixando livre a tua saída. Se você prefere arriscar a sorte a ficar comigo debaixo do nosso teto, eu suporto o solavanco de te ver cruzar cada umbral até chegar à rua. Mas escuta bem o que eu vou dizer, Chico. Nunca mais esse corpo vai ser teu, ouviu bem? Nunca mais. Você nunca mais vai se saciar em mim. Eu deixo todos os homens do bairro, do país, do mundo se servirem no meu sexo, mas você não. E eu ainda hei de te ver feito cachorro correndo atrás de mim, louco, alucinado de desejo e tudo que eu vou fazer é chutar lama na tua cara e te atirar pedra nos lombos.
            É isso que vai acontecer, está me entendendo? Agora vai. Vai! Vai encontrar naquela vagabunda o que você não encontra em mim por não saber procurar. Mas ainda haverá mãos que vão saber correr cada poro meu e bocas pra tirar um mel que na tua terá gosto de vinagre. Essa mulher que um dia já foi tua vai ser de muitos outros e todos vão saber que você nunca foi homem. Todo mundo vai saber que você nunca passou de um moleque. Passa fora dessa casa antes que eu te abra com uma faca, antes que eu deixe viúva quem nem sequer te tem por marido ainda. Passa fora! Passa fora!

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